Caleta Tortel: A inusitada cidade sem ruas
aleta Tortel é um povoado à parte. Imagine uma pequena cidade sem ruas, apenas passarelas de madeira e escadarias que levam a outras passarelas em níveis acima. Banhada por um braço do mar de águas de tom esmeralda, as casas se erguem nas encostas das montanhas, por entre uma vegetação verde exuberante.
Para chegar até lá, tomamos um ônibus a partir da fazenda onde havíamos passado os últimos dois dias, pois sabíamos que tentar carona nessa época na carretera já não está nada fácil. Na última noite que passamos no campo, Alessandro trouxe ainda mais dois mochileiros para casa. Então, na manhã seguinte éramos quatro nos despedindo daquela família acolhedora e levando sopaipillas quentinhas que Alicia tinha acabado de fazer.
Fomos para a estrada e na hora certa o ônibus passou e um motorista simpático veio nos ajudar com as mochilas. Motorista esse, que tinha alma de guia turístico. Entenda, o ônibus é um circular normal, apenas faz o trajeto de uma cidade a outra, mas sempre que vê viajantes estrangeiros, vai logo contando de cada detalhe ao longo do caminho. Mostrou as árvores e contou para que finalidade é usada cada madeira, falou o nome das montanhas e rios, contou a história dos campesinos e de como era feito o transporte fluvial no tempo em que a carretera ainda não existia, até desviou um pouco o caminho para nos mostrar a confluência entre os rios Backer e Ñadis, onde se pode ver o contraste de cores das águas dos dois rios. Indicamos para todos que pretendem fazer o trajeto Cochrane > Caleta Tortel, que o façam com a empresa Patagonia Tortel, para que possa também ter essa experiência super legal que completou o que já seria bom naturalmente, já que a paisagem por si só já vale o passeio. O preço é parecido em todas as empresas, CH$ 7.000,00 por pessoa (nós pagamos menos, pois pegamos o ônibus já a certa altura do caminho).
Ali também tínhamos o contato de outra irmã do nosso couch David (parece que ele tem a família espalhada por toda a carretera hehe) e ligamos para ela assim que chegamos. Era sexta-feira e seu expediente já estava terminando, assim Lucia nos levou à sua casa onde mostrou tudo o que poderíamos precisar para passar o final de semana. Sim, ela e sua filha estavam saindo de casa para passar os dias de folga em Cochrane e nós ficaríamos ali com a casa só pra gente. Mais uma vez, parecia mentira que alguém confiasse tanto assim em dois estranhos de mochila, mas ficamos muito felizes em passar esses dias ali. Foram dias de tranquilidade e conforto, choveu um pouco no sábado e aproveitamos para ver uns filmes e passear pelo povoado, como se estivéssemos passando um final de semana de inverno na praia.
Apesar de linda para os turistas, a vida ali não deve ser nada fácil. As passarelas não permitem nenhum meio de transporte, então para todo lugar que você precise ir, tem de fazer a pé, muitas vezes subindo e descendo longas escadarias. O preço da comida é pelo menos o dobro do que no resto da carretera (que já é naturalmente cara), então ficamos imaginando como deve ser alto o custo de vida para essas pessoas que vivem de maneira muito simples nas pequenas casas de madeira que predominam no povoado.
Se você quiser ir a Tortel e não tiver um David na sua vida, que arranja lugar pra você se hospedar em todos os cantos, a cidade oferece diversas possibilidades, há várias pequenas pousadas e há um camping municipal grátis, com uma estrutura básica coberta, com mesas e banheiros, ficamos bem impressionados com o serviço oferecido gratuitamente. Além disso, há uma grande possibilidade de você ser convidado a passar a noite na casa de algum morador, pois se trata de um povoado realmente muito acolhedor, foi o que aconteceu com os dois outros mochileiros que dormiram na fazenda com a gente alguns dias antes.
As opções para comprar comida são bem escassas (você não vai encontrar frutas e legumes frescos por exemplo), há um pequeno “almacén” com produtos básicos e os preços são muito elevados, então se quiser economizar é bom comprar algumas coisas na vizinha Cochrane antes de pegar o ônibus. Apesar disso, estando lá você não vai se importar muito, Tortel é única, se você estiver por perto, não perca a oportunidade de visitá-la pois duvido que exista um lugar igual no mundo.
Na volta, tomamos o ônibus outra vez, até Coyhaique, custou CH$ 14.000,00 cada um, mas economizamos muito tempo de estrada numa época em que já está difícil conseguir carona. Foram sete horas de viagem e o dia estava um pouco mais frio que o normal. Em certo ponto mais alto da estrada, olhamos para fora e não pudemos conter a surpresa: tudo ao nosso redor estava branco, salpicado de neve que havia acabado de cair. Foi a primeira vez que vimos a neve assim, fresca.
Caleta Tortel não estava em meu roteiro, após ler este post vou cogitar passar por lá, não tenho certeza por que meu cronograma está apertado, se eu conseguir adiantar um dia até chegar em Chile Chico certamente irei lá. Valeu por me entusiasmar com esta cidadezinha. Um abraço.
Realmente Caleta Tortel tem seu charme, Alfredo. Se tiver um tempo passe por lá que temos certeza que não vai se arrepender. Se tiver qualquer dúvida ou queira mais alguma informação é só nos dar um toque. Um forte abraço!
Vou para o Chile nos próximos dias e não tinha encontrado quase nada sobre Caleta Tortel, apesar do povoado estar incluído no meu roteiro. Achei muito interessante os relatos de vocês. E agora estou mais empolgada em conhecer os lugares que vocês citaram. Obrigada