Melhor do que parece – Um mês sem Facebook

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á fazia algum tempo que eu andava um pouco incomodado com a conduta das pessoas nas redes sociais e na Internet como um todo, o excesso de informação (e o quanto dessa informação é simplesmente irrelevante ou propositalmente falsa) e a falta de civilidade e de empatia, mas o que mais estava me incomodando era o tempo que eu estava passando consumindo tudo isso, então resolvi me afastar por um mês e depois voltar aqui e escrever sobre como foi a experiência, pois bem, aqui está.  Dê o play e vamos juntos refletir um pouco sobre tudo isso:

A escolha dessa música também é muito peculiar, conheço O Terno há mais ou menos uns três meses e desde então tenho escutado todos os três álbuns deles feito um maluco e por isso acabo criando uma identificação mais forte que o normal com algumas letras. Essa em especial, traduz perfeitamente essa minha insatisfação e incômodo com relação às redes sociais:

Eu ando muito insatisfeito
Nada me agrada mais
Eu não consigo ouvir um disco
Ou ver um filme e
Um livro eu claramente não vou ler

Vou procurar em todo canto até
Achar onde eu perdi
Minha vontade, o meu prazer de conseguir
E a paciência que eu preciso para curtir

Eu tenho achado tudo chato, tudo ruim
Será que o chato aqui sou eu?
Será que fiquei viciado em novidade
E agora o tédio me enloqueceu?

Tudo está melhor do que parece
Eu olho e vejo tudo errado
Faz tempo que está tudo certo

Todo mundo sabe que boa parte de nós tem dedicado tempo demais às redes sociais, tem muita gente falando sobre isso inclusive, sobre esse nosso mais novo vício, mas de certa forma, não estamos dando muita atenção a isso, estamos fazendo uma vista grossa conveniente. É a fase da negação, é o alcoólatra que diz que tem tudo sobre controle, é a pessoa que diz que pára quando quiser, que ela só não quer naquele momento. Então, com esse tempo fora eu pude perceber que, de fato, eu estava viciado.

Antes de me aprofundar melhor em cada um dos pontos que quero falar, quero deixar claro que, obviamente, não se trata da opinião de nenhum especialista em psicologia, cientista social ou coisa do tipo, isso é só um relato de um usuário de Internet que resolveu repensar um pouco seus hábitos e refletir sobre o comportamento “da nuvem”.

“A paciência que eu preciso pra curtir”
Nesse primeiro ponto quero ressaltar o quão artificiais ficaram os nossos contatos e o quanto estamos fingindo ser algo que muitas vezes não somos. Nosso perfil serve pra dizer para o mundo quem somos, do que gostamos, do que não gostamos, pra brincar, pra brigar, na verdade mesmo, serve pra colocar tudo o que você quiser. Mas o que estamos colocando ali realmente reflete algo sobre nós? Quantas das suas últimas publicações você pode realmente se aprofundar e estabelecer uma boa conversa sobre isso? Quantos likes você distribuiu na última hora e quantos deles você vai realmente falar com a pessoa que publicou (ou sequer vai lembrar quem publicou)? Qual é o real significado dessa curtida? Ela diz “gostei disso”, diz “vi isso” ou diz “não gostei muito disso, mas gosto de você, então vou só concordar”? Você consegue perceber o quão rasa (e muitas vezes falsa) ficou essa relação interpessoal? Claro que você pode partir pra defensiva e dizer que é impossível manter uma relação que não seja rasa, visto que com a Internet atingimos muito mais gente do que pessoalmente, mas onde fica o meio termo nessa relação, esse é o X da questão.

“Será que fiquei viciado em novidade”
Intimamente ligado com a questão do tempo dedicado às redes sociais está a nossa ânsia por novidades. Já não conseguimos esperar um minuto sequer por qualquer coisa sem sacar o telefone do bolso e dar uma olhada no feed. Por termos uma abundância enorme de informações e acesso instantâneo a tudo isso nós criamos essa necessidade de estarmos o tempo todo ligados e atentos a qualquer novidade, por mais insignificante que ela seja. Repare que meu descontentamento aqui não é para o fato de termos acesso a tudo, eu acho isso sensacional, mas precisamos remover esse pensamento de que temos que absorver toda essa informação, até porque isso é impossível, é preciso ter mais controle sobre isso.

“Um livro eu claramente não vou ler”
Quando dedicamos tempo demais pra uma coisa só ficamos sem tempo para todas as outras. Talvez o lado mais positivo dessa experiência de ficar um mês sem Facebook foi o tempo que me sobrou pra fazer outras coisas que eu não estava fazendo ou estava fazendo muito pouco. Voltei a ler alguns livros que tinha abandonado, estou fazendo mais exercício físico, me dedicando mais ao ANH e ao trabalho como fotógrafo e, o melhor de tudo, tenho tempo livre pra não fazer nada. Isso é uma coisa que muitas vezes não valorizamos, mas que é essencial, é no tempo de abstinência total de qualquer atividade que temos novas ideias, novas reflexões ou simplesmente relaxamos. A ideia da viagem de bicicleta pelo Circuito Europeu, por exemplo, surgiu durante um desses tempos.

“Eu tenho achado tudo chato, tudo ruim”
Um outro ponto que eu não poderia deixar de comentar sobre a Internet é o excesso de ódio e de falta de empatia. Os haters e os discursos de ódio não são novidade, convivemos com eles o tempo todo, mas o que impressiona é como simplesmente aceitamos isso como normal e o volume monstruoso deles. Estamos disseminando muito mais informações que incitam a discórdia do que qualquer outra coisa. Particularmente eu acho que isso é fruto da nossa necessidade de parecermos melhores que o outro, de mostrar que nosso ideal é mais bonito que os outros, que a nossa verdade e o nosso Deus são o que o mundo todo precisa seguir. Outro ponto importante aqui é a polarização de ideias, isso favorece muito o discurso de ódio e isso é um movimento global que me dá medo, podemos ver isso claramente no cenário político. Não precisamos de exemplo melhor que a Tay, robô de inteligência artificial da Microsoft que replicava informações de outros usuários e em menos de 24h se tornou uma “garota mimada, nazista, ninfomaníaca e preconceituosa”.

“Tudo está melhor do que parece
Eu olho e vejo tudo errado
Faz tempo que está tudo certo”
Não por acaso e nem por falta de importância, deixei esse ponto pro final. A predominância do ódio que comentei no ponto anterior faz com que a gente absorva um viés pessimista sobre o mundo e sobre a humanidade. Zygmunt Bauman, um filósofo considerado pessimista diz que “as redes sociais são uma armadilha” e nesse ponto concordo com ele, mas nessa conclusão quero trazer uma visão realista, nem pessimista, nem otimista. O mundo está se tornando um lugar melhor a cada dia que passa, tem bilhões de pessoas empenhadas nessa causa. Tem muita gente fazendo força pra que o contrário aconteça também, mas temos que ver as coisas através de um contexto de proporção. É óbvio que hoje ocorrem muito mais tragédias do que a 50 anos atrás então isso automaticamente nos leva a pensar que as coisas estão piorando, mas não, elas acontecem mais porque tem mais gente viva, simples assim. O mundo está num crescimento constante, um dia isso vai estabilizar, mas até lá vamos ter que nos contentar com muitos números aumentando, inclusive o das tragédias. E todas as mídias (a Internet não é exceção) estampam as tragédias na primeira página, sabe por que?! Porque “ver sangue é que é legal”: impacta e dá Ibope, tudo o que uma mídia precisa pra se manter. Mas tudo é uma questão de proporção, lembre-se disso.

Se eu puder dar uma conclusão sobre esse último mês eu diria que foi um mês positivo, onde muitas coisas boas aconteceram, a grande maioria delas simplesmente porque eu tinha mais tempo e ânimo para fazê-las. Eu sempre me considerei um usuário que sabe filtrar os conteúdos que consome, que realmente buscava coisas boas e positivas pra consumir nas redes sociais e na Internet de modo geral, mas nesse último mês aprendi que apenas estabelecer filtros não é o suficiente, precisamos pensar melhor sobre a utilização da Internet como um todo.

Se alguém está curioso pra saber se eu vou voltar pro Facebook, a resposta é sim, mas vou limitar meu acesso. Vou manter a rotina de não ter o aplicativo no celular, acessar pelo computador e apenas uma vez ao dia. Ao mesmo tempo que tive todos esses vislumbres sobre o aspecto negativo da utilização das redes sociais, perdi alguns pontos que considero positivos como as informações de alguns grupos que tenho lá, algumas páginas que sigo e também eventos que aconteceram e que não fiquei sabendo. Então vou tentar utilizá-lo de uma maneira mais consciente do que vinha fazendo para seguir tendo acesso a essa parte boa e diminuir o impacto dos aspectos negativos que encontrei.

Talvez eu estenda essa reflexão pra mais algum post, mas por enquanto eu acho que é isso que eu tinha pra falar. A foto de capa desse post é da Laguna Torre em El Chaltén, um momento muito especial e de muita reflexão. E dando continuidade às atividades aqui no ANH, já estou preparando o roteiro para a viagem de test drive que vou fazer com meu pai que comentei outro dia e logo mais terá um post novo falando sobre isso. Até lá!

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Comentários
  • Osmar Graciola Junior
    Responder

    Muito boa a matéria, Diego Nunes. Como tantas outras que vc já publicou!
    Eu já pensei, e já tive a mesma experiência de deletar o facebook da minha vida.. voltei, como pode ver.. Mas o tempo que fiquei fora desse mundo me fez refletir como vc.. é ruim ficar fora das coisas boas tbm, mas o facebook normalmente tem poucas dessas..
    Deixei de seguir amigos que não acrescentavam, sem dar a oportunidade a eles de mudarem e quem sabe hoje estarem publicando coisas melhores..
    Já ao que se refere a empatia, estou fazendo palestras para crianças a partir dos 12 anos, nas escolas. A palestra é sobre Bullying, mas o assunto que eu mais me aprofundo é o conceito de empatia. E ao fazer uma pesquisa sobre qual o ponto mais interessante da palestra, as crianças tbm respondem que a parte da empatia é a mais legal de se ouvir.. infelizmente estamos deixando de passar esse conceito nas escolas, será?
    Enfim.. venho fazendo minha parte praquilo que acreditamos fazer um mundo melhor!
    Parabéns novamente!
    Abraço!

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